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30 de dez. de 2014

Zaphir - Resenha



Zaphir – A Guerra dos Magos, de Gilmar Milezzi





Sinopse

Imagine uma adolescente com o corpo magro e desengonçado, que é vista pelas pessoas como uma esquisitona, em razão do seu jeito estranho e dúbio. Essa é Gabriela, uma menina valente, que gosta de futebol e jogos de taco, e que não leva desaforo para casa, seja de quem for. As meninas a detestam pelo pouco apreço que ela demonstra com aquilo que consideram normal no universo feminino, como roupas e garotos. Os garotos, por sua vez, não sabem como agir com uma menina que age e se comporta como se fosse um deles. Eles a chamam de “Perereca Musculosa”, mas ela aparentemente não se importa com a alcunha. Antes, parece até mesmo esboçar um breve sorriso de satisfação. Entretanto, o que se vê na aparência nem sempre corresponde à verdade. 

Agora pense num garoto franzino, com cara e jeito de nerd, imerso numa vida tediosa e sem perspectiva. Imagine-o às voltas com as dificuldades próprias da idade, em razão da timidez e do desconforto quase permanente com a sua inadequação social. Esse é Michel, um garoto solitário e invisível, como tantos que existem por aí e ninguém percebe. Sua existência é tão introspectiva e sem graça, que o melhor que pode fazer é sonhar com outra vida. Uma vida em que ele possa lidar com suas dificuldades com um simples estalar de dedos. 

Vamos imaginar agora que as linhas do destino desses adolescentes se cruzam e unem seus sonhos, alegrias e tristezas. Então algo acontece durante um jogo de videogame. Como por um encanto eles se transpõem para outro mundo. Um lugar de magia, onde são pessoas diferentes, com habilidades sobre-humanas e capazes de feitos extraordinários. Você voltaria para a vida anterior, comum e sem graça? Esse é o dilema que se coloca para eles. Desistir não é possível e esquecer-se de si mesmo põe em perigo a própria existência no mundo real. Aos poucos eles percebem que foram pegos numa armadilha, onde a realidade deixa de ser uma certeza e se torna apenas uma questão de ponto de vista.



Considerações

É emocionante ver um colega de sonho de tanto tempo materializar seu objetivo após uma longa jornada. Conheci o Gilmar Milezzi anos atrás através de uma comunidade de escritores do falecido Orkut, e acompanhei o início da saga de Gabriela e Michel, magicamente transportados para um mundo mágico cheio de mistérios através de um jogo de videogame que lhes foi dado por uma criatura muito suspeita. Ao longo dos caminhos da escrita mantive contato com Gilmar, e soube que, como eu, ele aperfeiçoava seu bebê para um dia trazê-lo a público. Enfim este dia chegou e o livro “Zaphir” está à venda. 

A trama gira em torno de Gabriela e Michel, dois jovens adolescentes que têm seus problemas em casa, seus dilemas típicos da idade e seus conflitos interiores. Gabriela é uma garota atípica que impõe respeito até nos garotos valentões da sua escola. Já Michel é um garoto franzino e inteligente que sofre bulling. Os dois são melhores amigos um do outro e, depois de acontecimentos excepcionalmente ruins na escola, decidem testar um jogo de videogame que ganharam do misterioso dono de um sebo em um bairro afastado. O estranho, que se apresentou como Icas, é perneta, negro e baixinho, e usa um capuz vermelho, o que o faz parecido demais com o folclórico Saci para que a semelhança seja ignorada. E, quando o jogo começa, a aventura que se estende à frente dos garotos parece real demais, e eles não sabem se estão vivendo uma realidade virtual ou se estão realmente em uma dimensão paralela.

O livro apresenta várias características clássicas da fantasia, como a presença de elfos e magos, uma busca por joias mágicas e uma profecia. No entanto, o ponto mais forte do livro é a construção dos personagens, principalmente os protagonistas. A entrada deles na adolescência é marcada por conflitos emocionais e mudanças físicas, ambos imensamente acentuados quando são transportados para o mundo fantástico do jogo, onde devem chegar a Walka e descobrir qual é a verdadeira ligação que têm com aquele lugar e com a profecia em curso. Lá, as mudanças intensas que sofrem, que incluem o amadurecimento muito acelerado de Gabriela e o compartilhamento de corpo de Michel com o elfo Bullit, os fazem divergir um do outro, e só a grande amizade (e, talvez, algum sentimento mais entre eles), os mantêm juntos.
Para além da fantasia e dos dilemas adolescentes, o autor levanta muitas questões filosóficas por todas as páginas, o que leva o leitor a pensar sobre nosso plano existencial e sobre a possibilidade de elevação espiritual, mesmo que no livro o tema seja abordado de forma lúdica, utilizando a magia como elemento alegórico para tais questionamentos. 

Como todo livro independente, há algumas críticas a fazer. A primeira é sobre a capa, e aqui o problema não está na imagem, que ficou linda e sei que foi um trabalho do filho do autor, mas a impressão ficou muito escura. Como vi a imagem original na internet, a mesma que está neste post, sei que ela possui muito mais detalhes que a versão impressa deixou aparecer, o que mostra que a gráfica deveria ter tido mais cuidado. O texto em si precisa de uma nova revisão, embora eu saiba, por contato com o autor, que este ponto foi outro deslize da gráfica, que usou um arquivo errado na hora da impressão. Os erros não comprometem a leitura, mas causam um pouco de desgaste, principalmente por inserir letras maiúsculas no meio de frases, ou por não usá-las no começo de outras e por não manter o mesmo tempo verbal em toda a narrativa, passado de pretérito para presente e vice versa. 

O bom trabalho com os personagens, a trama bem amarrada e um final interessante que dá espaço para uma sequência, são suficientes para dizer que Gilmar Milezzi é um autor a ser observado, e que logo devemos ouvir falar mais sobre ele por aí. Até porque ele vem fazendo um extenso trabalho de divulgação, fazendo de sua obra um produto profissional.

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